sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Não Sou Difícil de Entender


Eu não sou uma pessoa difícil de entender. Por mais complexos que sejam meus processos, ou por mais herméticos que pareçam meus pensamentos, eu tenho sim um manual de instruções. Ele tem umas oitocentas e trinta e três páginas, mas acredite, está tudo lá. Meu temperamento é tranqüilo, e até mesmo os dois irmãos gêmeos (tão diferentes em gênio) que compõem a minha alma concordam em ser tranqüilos na maior parte do tempo. Mesmo um deles sendo agitado e ansioso, e o outro sendo calmo e ponderado, ambos acreditam que quem está de fora não precisa, salvo raras exceções, seguir o ritmo das suas eternas trocas de lugar.

E eu sonho. Mas sonho pouco, em momentos especiais. Pra mim sonhar é algo feito por prazer, não por necessidade ou impulso. Meus sonhos são sempre bem destacados da realidade. Mundos à parte. E não gosto de misturar sonho com realidade, por achar que sonho serve pra inspirar, e não para iludir. Serve de ideal, é fonte de maravilha, e não uma rota de escape ou refúgio para fracos. Porque eu vivo mesmo é na realidade. E a realidade é na grande maioria das vezes dura, feia, e boa de porrada. Só o uso competente do material do sonho é capaz de amolecer, acalmar e embelezar um pouco a realidade. E eu não vou viver sonhando acordado, pois a vida bate mais forte em quem se distrai com fadinhas.

Eu acredito em ciclos de energias, acredito em vibrações, acredito em eletricidade, em química, em dimensões, e em coisas que ainda somos incapazes de entender. Acredito que damos nomes errados a algumas coisas. Acredito que damos mais valor a esses nomes errados do que à busca por conhecer os nomes certos. Acredito que se mata e se morre por nomes, por meros nomes que damos a energias que não entendemos. Por isso, me desfiz dos nomes. Olho com desconfiança quem dá nome pra tudo, e se arvora a saber todas as respostas. Prefiro me concentrar em minhas próprias perguntas. Elas já são mais que suficientes para esta vida.

E eu vejo, e eu sinto, e eu sigo navegando nesse mundo tão estranho. Há quem pense que eu vejo muito, há quem pense que eu sinto pouco, há quem ache que eu devia navegar por outras águas. Mas cada vez que eu sinto vontade de escrever, acontece a minha redenção. É o momento em que mostro que vejo o necessário, que sinto na exata medida, e que navego nas águas dessa corredeira que o meu destino deitou diante de mim. Ora cascateando por entre as mais mortíferas pedras, ora placidamente banhando as mais belas margens, mas sempre, sempre em direção àquele quente litoral que eu vislumbro nas horas em que sonho.