segunda-feira, 23 de maio de 2011

Quando o fato real vira faz-de-conta


Assisti no fim-de-semana o filme Casino Jack, estrelado por Kevin Spacey. A pelícila conta a ascensão e a queda de Jack Abramoff, um lobista de primeira linha em Washington. Ambientado no período moralmente dúbio do governo de George W. Bush, a história acompanha Abramoff e seu assessor mais próximo tomarem a decisão de comer o fruto proibido do lucro fácil através da corrupção pura e simples. Os dois embarcam a partir de certo momento em um perigoso esquema de faturamento milionário, mas com alto risco. Empenhando a reputação e influência ímpares que Jack tinha amealhado em anos de serviço na Capital, os dois se atolam até o pescoço em um esquema envolvendo cassinos, mafiosos e tráfico pesado de influência.

O que mais impressiona ao assistir-se a um filme desse tipo, é o quanto percebe-se que ainda estamos longe de ter uma democracia digna de ser assim chamada aqui pela terra dos tupiniquins. Assistir a uma história como essa, com a ótica de quem já acompanhou casos como o mensalão, por exemplo, é algo quase surreal. É um filme retratando fatos que aconteceram em um dos países mais criticados e ideologicamente combatidos do mundo. Ao mesmo tempo, um filme mostra o quanto o Brasil ainda tem que comer de arroz-e-feijão para se tornar uma nação de verdade. O corrupto americano vai preso, o senador tem medo de ter seu nome mencionado nos jornais. E quando um esquema de corrupção aparece na mídia, é um Deus-nos-acuda. Os principais operadores do esquema se desesperam quando ficam sabendo que "a casa caiu". Completamente diferente da completa serenidade que a impunidade verde-amarela confere aos nossos poderosos da vez.

Aqui, na terra dos multiplicadores de ganhos à base de consultorias mágicas, no reino do faz-de-conta, no mundo maravilhoso das pizzas, nada disso acontece. A maior justificativa para assistir a esse filme, além da boa interpretação de Mr. Spacey, seria a oportunidade de sentir o quanto é peculiar ver um filme baseado em fatos reais se tornar mais fantasioso aos nossos olhos do que o caos institucional completo no qual vivemos mergulhados. O quanto é surreal percebermos que um filme que mostra fatos que de fato, realmente aconteceram, parecerem a nossos pobres olhos verde-amarelos, a mais pura ficção científica. Chega a ser assombroso. Pobre país o nosso.